quarta-feira, 7 de abril de 2010
CONTO CONTADO: JARDINEIRO DE MIM
A PORTA DE ENROLAR DA VITRINE ESTAVA FECHADA. ERA UM SÁBADO DIFERENTE, SÁBADO DE ALELUIA, A CIDADE PRATICAMENTE VAZIA, NENHUM CLIENTE À VISTA...ENTÃO EU OLHEI EM DIREÇÃO À PORTA DE VIDRO E O VI.
ELE ESTAVA LÁ, PARADO, OLHANDO PARA MIM, AS MÃOS NOS BOLSOS DO SHORT DE TACTEL VERMELHO, O TORSO QUE EU ADMIRAVA DE LONGE UMA VEZ MAIS NU. ELE PASSOU A MÃO DIREITA NA CABEÇA RASPADA E SORRIU. A MÚTUA VISÃO DAQUELE SORRISO MAROTO E DAQUELE SOVACO ME DEIXARAM MUDO. INCAPAZ DE EMITIR UMA PALAVRA SEQUER, EU LHE APONTEI A PORTA, IMPLORANDO-O QUE ENTRASSE. ELE ENTROU, FECHOU A PORTA ATRÁS DE SI E AVANÇOU EM MINHA DIREÇÃO. EU NÃO PUDE DEIXAR DE NOTAR QUE ELE NÃO USAVA CUECA. CONTUDO, MEU RECEIO MAIS IMEDIATO ERA QUE ELE PUDESSE OUVIR O BATER DESESPERADO DO MEU CORAÇÃO. ENTÃO EU FINALMENTE CONSEGUI PRONUNCIAR ALGO:
- QUE BOM QUE VOCÊ ESTÁ AQUI! EU NUNCA IMAGINEI QUE UMA AVENIDA PUDESSE SER TÃO INTRANSPONÍVEL...
- E EU JAMAIS PODERIA IMAGINAR EXISTIR ALGUÉM MAIS TÍMIDO QUE EU. NAS INÚMERAS VEZES EM QUE NÓS TROCAMOS OLHARES, O QUE EU MAIS QUERIA ERA VIR CORRENDO PARA TI.
- EU...EU SENTIA O MESMO. MEUS DEUS! EU NÃO POSSO ACREDITAR QUE NÓS TENHAMOS SIDO TÃO COVARDES...
- NÃO SEJA TÃO SEVERO CONSIGO MESMO. TUDO VEM NO SEU DEVIDO TEMPO. SE NÓS RELUTAMOS TANTO EM ESTARMOS FRENTE À FRENTE, FOI PORQUE A INTENSIDADE DO QUE SENTÍAMOS NOS CAUSOU MEDO. EU AINDA TENHO MEDO...CARA, EU NUNCA SENTI ISSO POR NINGUÉM ANTES...
ENFIM ME LEVANTANDO DO COMPUTADOR, EU CONTORNEI A LONGA MESA E ENTÃO FIQUEI, DE FATO, FRENTE Á FRENTE COM AQUELE HOMEM QUE DURANTE OS ÚLTIMOS MESES TINHA ME LEVADO Á LOUCURA. ELE NÃO ERA BONITO. DISSO EU JÁ TINHA TIDO CERTEZA NAS DUAS VEZES EM QUE QUASE NOS ESBARRAMOS. NA PRIMEIRA VEZ, EU ME PREPARAVA PARA ATRAVESSAR A RUA QUANDO O VI DESCENDO EM MINHA DIREÇÃO. SEM CAMISA, ELE CARREGAVA UM PNEU DE BICICLETA EM TORNO DO PESCOÇO DE UM MODO TÃO NATURALMENTE ELEGANTE QUE EU NÃO CONSEGUIA DESVIAR O OLHAR. QUEM ESTAVA NOS CARROS ESPERANDO O SINAL ABRIR DEVE, CERTAMENTE, TER PERCEBIDO. MAS EU SÓ PENSEI NISSO MUITO DEPOIS. NAQUELE MOMENTO TODO O MUNDO SE RESUMIA NAQUELE GAROTÃO BAIXINHO E CHARMOSSÍSSIMO CAMINHANDO PARA MIM. ENTÃO NOSSOS OLHOS SE ENCONTRARAM E, PELO QUE PARECEU UMA ETERNIDADE, NÓS GRAVITAMOS UM EM TORNO DO OUTRO. AMBOS ANSIOSOS, ESPERANDO QUE O OUTRO SE MANIFESTASSE. MAS NENHUM DOS DOIS SE MANIFESTOU E AQUELES DOIS CORPOS DESTINADOS À COLISÃO PASSARAM UM PELO OUTRO E VOLTARAM ÀS SUAS RESPECTIVAS E SOLITÁRIAS ÓRBITAS.
NA OUTRA VEZ, O ENCONTRO ACONTECEU NO MEIO DE OUTRA RUA, NO EXATO MOMENTO EM QUE AMBOS A ATRAVESSÁVAMOS. FOI TUDO MUITO RÁPIDO, MAS A TROCA DE OLHARES FOI PROFUNDA E SIGNIFICATIVA. ERA NOITE, EU FECHARA A LOJA E SEGUIA RUMO AO SHOPPING. ELE ESTAVA LINDO, TODO DE PRETO, ELEGANTÍSSIMO, TRAZENDO NAS MÃOS UM PACOTE DE FOTOS RECÉM-REVELADAS. TALVEZ POR ISSO EU NÃO O TENHA NOTADO DE ANTEMÃO. ELE ERGUEU OS OLHOS PARA MIM E EU VI O MESMO MEDO QUE MEUS OLHOS TAMBÉM REVELAVAM. MEDO DO QUE, EXATAMENTE? MEDO DA REJEIÇÃO. MEDO DE ESTAR MAL AVALIANDO UMA RELAÇÃO NASCIDA DA CONTEMPLAÇÃO, AO VÊ-LO CUIDAR DO JARDIM DA CASA EM FRENTE -E MANTIDA À DISTÃNCIA. MEDO DE SE ENTREGAR A OUTRO HOMEM... MEDO DE SER FELIZ! O MESMO MEDO QUE NOS PARALISA -MESMO AGORA, QUANDO ESTAMOS UM EM FRENTE AO OUTRO, QUANDO NÃO EXISTEM MAIS DISTÃNCIAS A NOS SEPARAR.
BY jOÃO vITOR LINZ (1999)
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